Amigos,
Esta reportagem foi produzida em 2014, pelo jornal laboratório dos estudantes
da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (ECO/UFRJ).
Na época, não consegui um exemplar impresso e só tive o prazer de vê-la agora,
na internet, quase dois anos depois que fui entrevistado pelo repórter Luciano Abreu.
A matéria é bem caprichada: conversou com vários colecionadores aqui do Fórum,
citou nossos Lanchinhos e exposições e aborda o tema da paixão por Playmobil.
Abaixo, a transcrição completa:
BRINQUEDO DESTINADO A ADULTOS
Colecionadores loucos por Playmobil se unem para 'brincar'
Zero Town é uma cidadezinha pacata. Dispõe de um sobrado para aluguel suspeito de ser mal assombrado. Perto dali, o banqueiro, Sr. Rockfeller, passeia em frente ao empreendimento exibindo uma longa cartola branca, apoiado em uma bengala amarela, da mesma cor do ouro que supostamente carrega consigo numa bolsa. Ele está despreocupado. Pudera: é amigo do recém-chegado xerife da cidade, Schaper. O antigo xerife, no desfrute da aposentadoria, abriu uma simpática quitanda, a Grocery. Ali trabalha Mary Jane, que desperta muita admiração no patrão viúvo. Do lado aposto à quitanda, soldados trabalham na construção da escola pública da cidade, ao lado do quartel general. Trabalha também ali por perto Sr. Smith, o faz-tudo: é ferreiro, pedreiro e armeiro. Ele é também um sonhador: quer abrir um comércio próprio. Essa cidade fica na rua Domingos Ferreira, próximo à Constante Ramos, em Copacabana, zona sul do Rio de Janeiro. Carlos Alberto Guimarães é o xerife que comanda a Zero Town. Bom, não é exatamente o xerife, mas o dono e responsável pela montagem da cidade.
E foi realmente por conta de um xerife, embora de plástico, de 7,5 cm de altura, que ele entrou de vez no mundo do Playmobil, há 36 anos. Lançado na Alemanha em 1974, o brinquedo se expandiu na Europa no ano seguinte; um ano depois chegou ao Brasil. Em 1977, Carlos Alberto ganhou a primeira caixa, a do xerife do faroeste. Décadas se passaram, e a coleção ficou guardada até que em 2009 ele resolve, de fato, virar colecionador da linha fabricada durante a infância, à época fabricada pela empresa brasileira Trol, já falida. A ideia inicial naquele ano era se desfazer dos brinquedos dos tempos de criança. Em um dia, no final de expediente numa redação de jornal, Carlos Alberto se deparou com uma reportagem do ‘Globinho’ sobre um colecionador de Playmobil. Logo entrou em contato com ele e recebeu o convite para participar de um encontro entre amantes dos pequenos bonecos.
“A exposição foi no Humaitá. Levei para lá a minha coleção. Montei um cenário e foi ali em que fui 'picado' ao ver o apreço que os expositores tinham com o brinquedo. Em vez de vender, passei a colecionar”, lembra o jornalista.
César Ojeda, empresário, 48 anos, foi o personagem do jornal lido por Carlos e o responsável por torná-lo mais um expositor. “O Carlos Alberto inicialmente se aproximou para oferecer seus Playmobils para a venda. Mas eu o incentivei a não deixar os brinquedos. Pelo contrário, preservá-los, e a partir daí ele tomou gosto.” Nesse mesmo ano, Ojeda criou o fórum on-line PlayBrasilmobil. Lá se reúnem apaixonados pelo brinquedo que compartilham as coleções, promovem trocas e vendas, exibem fotos com cenários criados – chamados dioramas – e marcam encontros. Os eventos são mensais, segundo Ojeda, e se alternam entre Rio e São Paulo.
A informalidade é praxe, inclusive no nome: Lanchinho Playmobil. A intenção era trazer para o mundo real o contato entre colecionadores e fãs que se fortificava no ambiente virtual por meio do fórum. O mais recente teve no convite um boneco roqueiro. A intenção era aproveitar o Rock in Rio, realizado pouco tempo antes do encontro. “Os Lanchinhos não são temáticos. Cada um que queira participar com uma vitrine pode levar o que quiser para expor. Os convites virtuais que faço a cada edição são uma tentativa de dar um charme a mais ligado à cidade, a um evento, como o RIR, ou à época do ano”, explica.
Louco pelos brinquedos Carlos garante que não é, mas durante a conversa com a reportagem no apartamento dele, sempre esteve no discurso do colecionador essa característica. “Comprei uma coleção inteira de um rapaz na Tijuca logo quando resolvi colecionar. A companheira dele ficou em dúvida se ele conseguiria vender aqueles bonecos antigos, mas com a venda realizada ela constatou que tem louco para tudo”, conta, aos risos. Ele define o fórum do amigo Ojeda como espaço em que “tem muito maluco que fala de suas neuras e cuidados com os brinquedos”. Ele citou um vídeo gravado às escondidas de funcionários dos Correios arremessando encomendas sem nenhum cuidado no depósito da empresa em Niterói, região metropolitana do Rio. O flagrante foi tema de discussão. “Imagina se nessas caixas tivessem caixas raras de Playmobil?”.
E no mesmo fórum houve um caso que Carlos conta que mais se aproxima de loucura, vinda de um colecionador. “Ele escreveu uma mensagem no grupo: anunciou o afastamento dele dali. O motivo era porque os brinquedos estavam comprometendo o casamento. O cara investia demais nos Plays”, relata.
Longe disso, Carlos Alberto se define um colecionador comedido. Segundo ele, sempre pagou pouco pelas ofertas que chegam pelo próprio blog, playvender.blogspot.com. O endereço virtual presta serviço aos “playmobilistas”: anuncia as datas das próximas grandes exposições do fórum. Já houve cinco no Rio: no Museu Militar Conde de Linhares, em São Cristóvão (2009 e 2012), na Unisuam, em Bonsucesso (2010) e no Forte de Copacabana (2011). Também no blog Carlos publica informações acerca dos fabricantes do brinquedo ao longo dos anos, antigas propagandas em revistas e gibis, catálogos e manuais de instrução. É o que ele chama de “memorabilia”. E tem mais: com frequência monta dioramas, fotografa-os e cria uma história.
A Zero Town é um exemplo, nascida em cima de uma cama de solteiro. “Penso sobre o que vou brincar... Penso, monto, fotografo, edito, publico”, descreve o colecionador de 41 anos. Ele encara esse ritual como escape do cotidiano.
De acordo com o psicólogo Fábio Dias, o hábito de se dedicar à coleção e interagir com ela ameniza dores e possibilita a ressignificação subjetiva, em que o sujeito compõe dioramas não de forma motora, mas por inspiração e criatividade, permitindo a vivência de emoções: nostalgia de brincar e bem-estar, por exemplo. “Cria-se um espaço sem sofrimento, preconceitos ou ganância, onde o mais importante é deixar a criança interior tomar as rédeas”, esclarece. “Se desprender das angústias e sofrimentos nos dá possibilidade para que nossa mente possa elaborar tais dores e prevenir de somatizações, ou seja, de sofrimentos da mente que desencadeiam doenças ao corpo.” O hobby é mais do que salutar na visão do psicólogo, que também tem um. Qual? Colecionar Playmobil.
Morador de Piracicaba (SP), Fábio, de 35 anos, participa de exposições e Lanchinhos na capital paulista. Em todas as ocasiões monta dioramas. Para ele foi fundamental iniciar a coleção, em 2010, ano em que perdeu a irmã caçula. “O contato com o Playmobil serviu como válvula de escape para a elaboração do luto”, resume. A coleção, em contrapartida, teve nenhum planejamento. Fábio quis presentear os sobrinhos com os bonecos, mas ao se deparar com a variedade de opções acabou levanto algumas caixas para ele também. Interessado em temas históricos, começou com a linha viking, partiu para a pirata e depois faroeste.
Conhecer os brinquedos por acaso e se encantar com as centenas de temas foi o mesmo caso do engenheiro de telecomunicações Marcius Victor Carvalho, 44 anos. Morador de Rio das Ostras (RJ), ele ficou “maravilhado com o conteúdo exposto, diversidade do acervo e criatividade nos dioramas” na exposição no Forte de Copacabana. Não deu outra. O filho quis comprar o brinquedo. Marcius comprou outro para ele. E a esposa também levou uma caixa de um presépio. “Meu filho brinca pouco e opta por outros brinquedos concorrentes. Eu mesmo sou quem cria histórias, tira fotos para o fórum, monta cenários... Por que não brincar também? E uma boa parte dos bonecos fica exposta na sala de casa”, revela o engenheiro. A preocupação em se descontrolar nas compras é constante na vida de Marcius. “Na verdade a vontade é sair comprando tudo”, diz.
O universo de opções oferecido pelo Playmobil colabora para a vontade de gastar. Para Fábio Dias, aí reside o perigo, mesmo considerando que não há limite padrão para um colecionador, desde que a coleção não se torne uma compulsão ou obsessão. “A maior loucura ao se colecionar brinquedos e outros objetos é reproduzir a vivência consumista presente em outros aspectos da vida, em que o objeto adquirido se torna ilusoriamente o que irá definir quem o adquiriu”, observa o psicólogo. Outro tipo de loucura, segundo ele, também surge no descontrole na compra desenfreada. “Obter itens e não ter onde guardá-los é um fantasma na vida de todo colecionador.”
Colecionadores de Playmobil - Jornal da ECO/ UFRJ
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Re: Colecionadores de Playmobil - Jornal da ECO/ UFRJ
Mensagem por guto veiga »
Bem legal, ainda não tinha visto o artigo.
Guto veiga
Guto veiga
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